Realidade Virtual e Realidade Aumentada Parte 2: Conceitos






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Continuando a série de 3 artigos relacionados à palestra que proferi no XVII Symposium on Virtual and Augmented Reality, " Os Limites do Virtual no Mundo Real ", abordarei agora quatro conceitos fundamentais:  virtual X real; presença, imersão e contínuo real-virtual.


Virtual X Real



Fala-se muito em ambientes virtuais, virtualização, aulas virtuais e por aí vai. Mas qual o verdadeiro significado de "virtual" ?

Virtual deriva da palavra latina virtus ( força, energia, potência ) e significa algo em potencial. Por isso quando um candidato ganha uma eleição para presidente, e até de fato tomar posse, a imprensa se refere a ele como virtual presidente. Logo, uma imagem exibida na tela do tablet não é virtual, é real. Tão real quanto uma foto exibida num porta-retrato.  

Vamos entender um pouco melhor o conceito.



Podemos dizer que sementes de café seriam um cafezinho virtual, mas são também plantas de café virtuais. Repare que um elemento virtual não é uma garantia de que em algum momento se tornará o real que virtualiza. Um cafezinho virtual (semente de café) pode, de fato, acabar se tornando uma linda árvore, ou se desintegrar e virar adubo. O processo de mudança que um elemento passa é chamado de atualização. A árvore virtual pode se atualizar como um cafezinho ou, de fato, como uma árvore. Mas mesmo se transformando numa árvore é impossível prever exatamente como essa árvore seria, enquanto o elemento se encontra na forma de uma árvore virtual (semente). O processo de atualização depende de fatores internos ao elemento virtual.  Deve ficar claro que semente e árvore são ambos reais, que semente pode ser chamada de árvore virtual, mas isso não garante que se tornará árvore, e que só teremos certeza que se tornará árvore (e como será essa árvore) após o processo de atualização. Em resumo: um virtual (que é algo real, mas não é aquilo que virtualiza) pode, ou não, gerar um atual (que também é real, mas apenas um real entre infinitas possibilidades). Um virtual gera um atual, mas não determina obrigatoriamente o real que será atualizado.  

Quem quiser se aprofundar no assunto "Virtual X Real" recomendo a leitura do livro "O que é o virtual", do filósofo francês Pierre Lévy



Virtual e Real no mundo da tecnologia


Por que os conteúdos exibidos em computadores e outros dispositivos digitais costumam ser chamados de virtuais ? 

Na verdade, os programas e arquivos é que são, virtualmente, tais conteúdos, uma vez que têm potencial para gerar as imagens, textos, áudios, animações, videos etc..  Mas os programas e arquivos também são reais, ainda que registrados na forma de bits. Um arquivo de imagem é uma imagem virtual, mas é um arquivo real. Quando a imagem é apresentada na tela do tablet (atualizada) passa a ser o atual daquele arquivo,  mas é uma imagem real, não virtual. 

Um arquivo de imagem pode ser chamado de imagem virtual e pode ser atualizado como uma projeção na parede ou como uma impressão em papel, por exemplo. Por que a impressão em appel não costuma ser referida como imagem virtual mas as projetadas em telas ou monitores sim ? Porque, intuitivamente, o que chamamos de virtuais são objetos que pdoem ser materializados e desmaterializados facilmente.  Sendo assim defino a seguir o que considero Virtual ou Real, no contexto das tecnologias da comunicação.






Presença

Sentir a presença de alguém ou de algo é intuitivo mas difícil de definir.  
Há uma associação ( ISPR - International Society for Presence Research ) especializada em estudos e pesquisas sobre presença (antigamente chamada de telepresença), formas de avaliá-la e de melhorar sua percepção.  
No site da ISPR há uma série de definições de presença. Inspirado em algumas dessas definições e em minha experiência com o tema cheguei à seguinte conceituação.
    

Veja que esse conceito estende o que acontece naturalmente em nosso corpo. Nas interações do cotidiano, com pessoas, objetos e ambientes que consideramos estar presentes, esquecemos da existência de uma mediação entre o mundo externo e nossa mente, que é o nosso sistema sensório. Isso vale também para elementos internos ao organismo. Quando sentimos dor de algum órgão, por exemplo, é como se a dor fosse sentida no local, mas de fato, é imaginada em nossa mente, pela interpretação de sinais elétricos que chegam ao cérebro. Daí a possibilidade de se sentir dor fantasma de um órgão que foi retirado de nosso corpo. Nossa evolução fez com que tenhamos facilidade em estender nossos sentidos e também abstrair ferramentas e meios de comunicação como extensões de nosso corpo ( a respeito dessse assunto sugiro ver também MARSHALL MCLUHAN - OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO COMO EXTENSÕES DO HOMEM ).  

Em resumo: quanto menos o usuário perceber a intermediação tecnológica mas facilmente sentirá a presença das pessoas e/ou objetos que estejam sendo intermediadas. Não significa que não possamos sentir presença mesmo com a explícita participação da tecnologia. Mas conversar com uma pessoa vendo-a na tela do computador ou projetada em tamanho real a sua frente certamente não gera a mesma percepção. 


Imersão


Bastante relacionado com presença, mas não exatamente a mesma coisa, é o conceito de imersão. Vários autores, como por exemplo Janet Murray (ver Hamlet on the Holodeck: The Future of Narrative in Cyberspace ) já discutiram o conceito de imersão.  Ao longo dos últimos anos venho estudando e lapidando esse conceito e cheguei na definição a seguir.


Veja que é possivel sentir presença sem imersão, mas não o inverso.


O Contínuo de Milgram

Há muito tempo a comunidade de pesquisadores e especialistas em realidade virtual e aumentada vem trabalhando com o conceito proposto por Milgram, no artigo " Augmented reality: a class of displays on the reality-virtuality continuum " . Trata-se de um conceito importante, conhecido como contínuo de Milgram, que diz que em um extremo temos o mundo real e em outro o mundo virtual, ou seja, partiríamos do real, passaríamos pela realidade aumentada e chegaríamos à realidade virtual.  Apesar da grande relevância desse artigo e do uso generalizado desse conceito, após várias discussões em encontros científicos e com colegas da área, em especial os professores Claudio Kirner, Alexandre Cardoso e Marcio Pinho, venho, com todo respeito e humildade, propor uma atualização nesse conceito.  


  
Isso se faz necessário porque, de fato, não há como partir de um ambiente real e se chegar a um virtual sem sairmos desse ambiente ( o contínuo passa a ideia de que ao se aumentar a quantidade de elementos virtuais sobrepostos ao real em algum momento o real sumiria, mas isso significaria uma quebra nesse contínuo, em algum ponto). Assim proponho que se trabalhe com a noção de dois contínuos, conforme abaixo. Aproveitei para introduzir os conceitos de real e virtual acima apresentados. Essa é a primeira vez que proponho tal abordagem. Portanto, em minhas publicações anteriores eu ainda trabalhava com o contínuo de Milgram original.  






Conclusão

Apresentei neste artigo minha visão sobre 4 importantes conceitos: Virtual X Real, Presença, Imersão e Contínuo de Milgram.  Espero que essa reflexão o ajude a melhor compreender e atuar nessa área multidisciplinar. 

Como tudo em Ciência e Tecnologia, esses conceitos estão sujeitos a revisões e aprimoramentos. Você leitor pode contribuir com essa evolução enviando suas críticas, dúvidas e sugestões. Desde já agradeço. 

PS: agradeço aos alunos Junior Magalhães e Adson da Cruz, do curso de Design Digital do Centro Universitário Senac por terem me auxiliado na pesquisa se materiais sobre as origens da RV e RA e por terem participado de discussões que  me ajudaram a refinar as definições de "Presença" e "Imersão".
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